Hoje, vou iniciar comentando sobre a mudança de comportamento do Fisco Estadual em relação as novas ações de arrecadação. Tudo se inicia após o recebimento de esclarecimento sobre a classificação de mercadoria no código da Tipi.

Estou falando da Informação Fiscal COSIT/CECLAM nº 98.037, emitida pela Receita Federal do Brasil em 15 de agosto de 2023, que traz respostas aos questionamentos feitos pela Secretaria da Fazenda do Estado do Amapá (SEFAZ-AP).

A dúvida do Fisco Amapaense está centrada na classificação fiscal de carne de frango temperada (em pedaços e inteiros), remetidas ao estado com a NCM 0207.14.00 e 0207.12.00; o que traz à tona uma questão essencial sobre a aplicabilidade da isenção de ICMS, conforme estabelecido no art. 37, III, “l” do CTAP.

O fisco estadual argumenta que a isenção não alcança os produtos mencionado anteriormente, pois o entendimento das indústrias de isentar referidas mercadorias se baseia na descrição contida no Código Tributário do Amapá (CTAP), onde a carne de aves é classificada na posição 0207.1 NCM/SH.

Portanto, das análises da RFB, motivadas pela dúvida da SEFAZ-AP, emerge a necessidade de uma avaliação minuciosa, não para contestar a classificação adotada pelo CECLAM – Centro de Classificação Fiscal de Mercadorias, mas que leve em consideração não apenas os elementos apresentados pela Receita Estadual, mas todo o contexto das normas que tratam da substituição tributária nos estados.

Especialmente as regras aprovadas pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que estabelecem diretrizes para a descrição de mercadorias submetidas ao regime de ICMS – Substituição Tributária.

Frequentemente, essas descrições de nomenclatura de mercadorias estabelecidas a nível estadual são mais abrangentes não se alinham perfeitamente com as compreendidas pela Receita Federal, conforme preconizado no Convênio ICMS 142/2018.

Neste diapasão, segundo a Sefaz/AP, em suas análises das Notas Explicativas do Sistema Harmonizado (NESH), chegou à conclusão que as carnes de aves, quando temperadas, deveriam ser classificadas no Capítulo 16, e não no Capítulo 2. Porém, em nenhum momento a SEFAZ/AP citou regras do CONFAZ quando dirigiu seu posicionamento à Receita Federal do Brasil.  

Na sequência, a Receita Federal do Brasil confirmou o entendimento da SEFAZ. Contudo, repiso: é crucial observar que a conclusão da RFB não levou em consideração as disposições específicas do Convênio ICMS 142/2018, particularmente no que se refere à descrição dos produtos para fins de exigência do ICMS-ST, certamente não é de sua alçada.

Voltando ao debate, é intrigante observar que o fisco estadual do Amapá recorreu à RFB para esclarecimentos sobre a classificação fiscal de carne de aves temperada, quando já existe um entendimento (parecer) expresso pela Coordenadoria de Tributação (COTRI), órgão vinculado à Secretaria da Fazenda e especializado em temas fiscais.

O Parecer que me refiro é o 2022.01.05.00002-COTRI, que aborda a aplicação da legislação tributária para isenções de carnes de aves e suínas temperadas, pois, conforme podemos observar a COTRI já havia estabelecido claramente que esses produtos se enquadram nas isenções previstas na legislação.

Conforme a decisão da COTRI as carnes de aves e suínas temperadas são isentas de ICMS, fazendo parte dos produtos da cesta básica. Tal questionamento e perfeitamente conhecidos por todos que atuam na área fiscal.

Esta divergência entre o entendimento anterior da COTRI e a recente solicitação de esclarecimento à RFB levanta dúvidas sobre a coerência e a justificativa por trás da decisão do fisco estadual de impor a cobrança de ICMS-ST aos contribuintes amapaenses.

Um outro aspecto que merece ser destacado é a possível variação na descrição dos produtos quando se trata da cobrança do ICMS via regime de substituição tributária.

Essa particularidade é claramente delineada na Cláusula Sétima, Parágrafo 1° do Convênio ICMS 142/2018, conforme veremos a seguir:

Cláusula sétima Os bens e mercadorias passíveis de sujeição ao regime de substituição tributária são os identificados nos Anexos II ao XXVI deste convênio, de acordo com o segmento em que se enquadrem, contendo a sua descrição, a classificação na Nomenclatura Comum do Mercosul baseada no Sistema Harmonizado (NCM/SH) e um CEST.

§ 1º Na hipótese de a descrição do item não reproduzir a correspondente descrição do código ou posição utilizada na NCM/SH, o regime de substituição tributária em relação às operações subsequentes será aplicável somente aos bens e mercadorias identificados nos termos da descrição contida neste convênio.

A norma estipula que, se a descrição de um item sujeito ao regime de substituição tributária diverge da descrição correspondente na NCM/SH, a aplicação do regime se dará exclusivamente conforme a descrição detalhada no convênio.

Aqui podemos observar que o questionamento levado pelo Fisco Estadual à Receita Federal merece manifestação por parte da Coordenadoria de Tributação – COTRI, pois em relação a descrição pode existir variação entre a classificação fiscal NCM/SH e as especificidades das regras de substituição tributária adotado no convênio.

Recordando, o questionamento apresentado pelo Fisco estadual à Receita Federal foi o seguinte: “… informa que, em suas fiscalizações, foi verificado que as indústrias, ao remeterem carne de frango temperada para o estado do Amapá, invariavelmente tem se utilizado das NCMs 0207.14.00 (pedaços de frango temperado) e 0207.12.00 (frango inteiro temperado) para determinar a classificação fiscal dessas mercadorias.”

Quando confrontamos questionamento do fisco com o Convênio ICMS n° 142/2018, ANEXO XVII PRODUTOS ALIMENTÍCIOS encontramos exatamente os produtos com NCM/SH isentos de icms, conforme previsto art. 37, III, “l” do CTAP. Todos os itens estão recepcionados em sua descrição produtos com temperos. Esses NCM/SH do convênio estão dentro da isenção. Vejamos:

87.017.087.000207; 0209; 0210.99.00; 1501Carnes e demais produtos comestíveis frescos, resfriados, congelados, salgados, em salmoura, simplesmente temperados, secos ou defumados, resultantes do abate de aves, exceto os descritos no CEST 17.087.02
87.217.087.020207.1; 0207.2Carnes de aves inteiras e com peso unitário superior a 3 kg, temperadas

Chamo atenção para o que foi definido no âmbito do Confaz, pois a falta de abordagem desta questão pela RFB, ou pela ausência de informação não repassada pela interessada, digo SEFAZ AMAPÀ, sugere que a Informação Fiscal deixa lacunas na compreensão integral das nuances tributárias expostas, especialmente quando se trata da aplicação prática de tais normas no contexto estadual.

Vejamos o que diz novamente a RFB: Correto, portanto, o entendimento da SEFAZ-AP, de que o frango congelado e temperado deve ser classificado no âmbito do Capítulo 16, pois o Capítulo 2 permite apenas as carnes salgadas, MAS NÃO COM O USO DE OUTROS TEMPEROS.

Ao contrário do que preconiza a Informação Fiscal da CECLAM, as regras para fins de substituição tributária aprovada no Confaz permitem que produtos em questão sejam classificados no capítulo 2, mesmos que contenham temperos e não somente salgados.

É importante notar que a competência da RFB se limita à classificação fiscal, não entra no mérito quanto a correta classificação para fins de cobrança do ICMS-ST. Essa limitação de escopo é fundamental na análise do caso.

Diante do contexto e das divergências identificadas, fica claro que a Informação Fiscal Cosit/Ceclam nº 98.037 não deve ser o único fundamento as ações arrecadatórias do fisco estadual.

É imprescindível que os contribuintes analisem de maneira crítica estas informações fiscais e confira a elas a devida validade jurídica ou não, especialmente considerando que as indústrias, detentoras do conhecimento técnico de produção e características de seus produtos, afirmam que a NCM/SH está perfeitamente alinhada ao ordenamento estadual.

O Estado deve realizar um exame jurídico detalhado das abordagens adotadas na  informação fiscal, assegurando que as ações do fisco estejam embasadas em uma compreensão completa e precisa das normativas tributárias. Principalmente, ouvir a outra parte, as indústrias; para que dê mais esclarecimento quanto adoção do respectivo NCM/SH 02.07.1 nas operações com Amapá.  

Por fim, o impacto dessas mudanças de comportamento do Fisco em tributar as carnes de aves temperadas terá repercussões diretas e significativas nos preços ao consumidor final.

À medida que nos aproximamos do final do ano, uma época de aumento do consumo, esta alteração de tributação refletirá em custos mais elevados, afetando o poder de compras das famílias amapaenses e a economia local.

Até a próxima.