RECURSO DE OFÍCIO
005/2019
PROCESSO
28730.024464.2014-1
LANÇAMENTO (ESPÉCIE)
AUTO DE INFRAÇÃO   N°1393/2014
CRÉDITO TRIBUTÁRIO
R$ 5.359.429,35
RELATOR (A)
SERGIO FLAVIO GALDINO LIMA
DATA DO JULGAMENTO
19/02/2019

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso de Ofício, nos termos do art. 205 da Lei n° 0400/1997, visto que a Decisão nº 183/2017 do órgão colegiado da JUPAF julgou parcialmente procedente o Auto de Infração 1.393/2014.

O crédito tributário cobrado nos autos totaliza R$ 5.359.429,35 (Cinco milhões, trezentos e cinquenta nove mil, quatrocentos e vinte nova reais e trinta e cinco centavos). A exigência decorre do não recolhimento de ICMS Antecipação – ST referente às notas fiscais de entrada de mercadorias e ICMS-Normal decorrente de retificações da conta corrente fiscal, exercício de 2010, 2011 e 2012. 

Foram indicados como infringidos os dispositivos da Lei 0400/1997: artigos 34, IX, 46, § 1°, 48 e 49 do Decreto n° 2.269/98 – RICMS-AP. Penalidade capitulada no art. 161, I, “c” da Lei n° 0400/97 e suas alterações posteriores.

 

Em sede administrativa, a impugnante compareceu no feito questionando a pretensão fiscal, (fl.390/396). Síntese dos argumentos:

                       

Da Contestação:

 – às planilhas elaboradas pelo Fisco, verifica-se que tudo gira em torno das discordâncias dos valores da base de cálculo escrituradas em livro fiscal. Portanto os números levantados pela fiscalização estão baseados unicamente na escrita fiscal, mais precisamente no Livro de Registro de Saídas e nas Declarações (DIAP);

– o Fisco não acusa a empresa de ter deixado de escriturar nota fiscal ou de sonegação, mas simplesmente discorda dos valores fixados como base de cálculo do imposto registrado no Livro de Saídas, por isso penalizou a empresa em decorrência de desencontro entre o valor do imposto informado pelo contribuinte e o escriturado no livro fiscal de apuração do imposto;

– livro de saídas, na coluna “base de cálculo”, existem alguns equívocos de escrituração, mas que foram devidamente corrigidos na escrita contábil do contribuinte. Ou seja, a base de cálculo real e correta do imposto foi escriturada nos “livros contábeis”, que por lapso, não foram apresentados à fiscalização em tempo hábil;

– a própria fiscalização, ao fazer a conta corrente do ano de 2010, verificou que em nos meses de junho, setembro, outubro e novembro o contribuinte recolheu imposto indevidamente, tendo em que, naqueles meses, apuração resultou em saldo credor, ou seja, em saldo favorável ao contribuinte;

– no mês de abril, a empresa recolheu imposto no valor de 18.325,88, quando na verdade, deveria ter recolhido apenas R$ 3.693,99, ou seja, recolheu o valor de R$ 14.631,89; assim também no mês de dezembro o contribuinte recolheu o valor de R$ 51.112,68, quando na verdade deveria recolher o valor de R$ 49.603,01;– esses exemplos reais explicam e provam que o contribuinte não apurou o imposto exclusivamente pelos livros fiscais e sim pela contabilidade, onde foram corrigidos vários equívocos especificamente em relação à base de cálculo do imposto;

– a escrita fiscal tem precedência sobre a escrita fiscal, principalmente quando a empresa possui escrita contábil regular, como no caso. Tanto é assim que o art. 465 do Decreto n° 2269/98 [trata do assunto];

– fica claro a precedência da escrituração contábil sobre a fiscal. Portanto, a fiscalização deveria tomar como base, não só a escrita fiscal, mas, e principalmente, a escrita contábil, uma vez que a empresa possui contabilidade regular.   

– nessa oportunidade, a impugnante apresenta, em anexo, os valores corretos da base de cálculo que deveria ser considerada pela fiscalização, de acordo com sua escrituração contábil, devendo ser consideradas devidas as diferenças especificadas nos demonstrativos, ora anexados;   

Da Diligência:

– na hipótese desta corte não acatar, de plano, os demonstrativos apresentados, a impugnante entende que há justo motivo para realização de diligência, com base no inciso IV do art. 188 da Lei n° 400/97.

Do Pedido:

–  antes do Julgamento do mérito, autorize a realização de diligência na escrita contábil da empresa, para confirmar os valores apresentados em anexo;

– acolham as provas e argumentos apresentados para declarar improcedente o crédito tributário;

 

Na sequência o relator, Gilson Carlos Rodrigues, solicita ao Presidente da JUPAF diligência do feito no tocante a escrita contábil da empresa para que seja verificado os valores apresentados na impugnação do crédito; se há discordância entre os valores apresentados pelo fisco e os valores escriturados nos livros contábeis (fl.400). Assim, processo administrativo foi encaminhado ao COFIS.  

 

Em atendimento à diligência, foi apensado aos autos a Informação Fiscal n°348/2017 – Coordenadoria de Fiscalização-COFIS, fls. 402/405. Onde parecerista enfrenta todas as questões colocadas pela impugnante e apresenta as fundamentações da escrita contábil. Assim, passo transcrever os pontos essenciais:

– o AI teve seu embasamento nos livros fiscais Registro de Saídas, no que se refere ao item questionado – discordância dos valores da base de cálculo escriturados nos livros fiscais;

– ao analisarmos o levantamento do Conta Corrente do ICMS declarados pelo contribuinte (DIAP’S), que compõe o AI, às fls. 21 e 22, especificamente na coluna “Valor contábil de saída” e “base de cálculo” referente aos exercícios de 2011 e 2012 encontramos valores declarados pelo contribuinte nas Declarações Informações e Apuração – DIAPS, conforme cópia anexa às fls. 151 a 211, dos autos, bem como os valores encontrados após a conclusão da ação fiscal;

– constatamos, também no levantamento do Conta Corrente do ICMS na Ação Fiscal, que compõe o AI, às fls. 18 e 19, especificamente na coluna na “Valor Contábil Saídas” e “Base de Cálculo” valores encontrados após a conclusão da ação fiscal, configuram a representação fiel dos valores escriturados nos Livros Registros de Saída;

– analisando a argumentação da impugnante na qual afirma que “a base de cálculo e correta do imposto foi escriturada nos livros fiscais contábeis, tem-se:

1. Especificamente nos itens “Valor Contábil Saídas” e “Base de Cálculo Saídas” do ICMS nos livros contábeis, constatamos o valor total de R$ 19.192.922,77 e R$ 9.953.015,83, no exercício de 2011 e de R$ 18.979.008,29 e R$ 11.739.965,94, no exercício de 2012, tabelas anexadas às fls. 397 e 398 – todos escriturados pela autuada.

2. Que os valores das tabelas, apresentadas na impugnação, representam a cópia fiel dos livros contábeis, não restando nenhuma dúvida de que os valores transcritos na argumentação da impugnante são reais;   

3. Então, com relação a este item, trata-se de alegação fundamentada, uma vez que os valores transcritos nas tabelas retratam exata e fielmente o conteúdo registrado nos livros contábeis da autuada.

Conclusão:

1 – Com relação ao item Auto de Infração x Livros Fiscais, ficou claramente demonstrado, que a motivação da lavratura do AI lastreou-se no descompasso entre os valores declarados nas DIAP’s e os valores escriturados nos livros fiscais (ambos realizados pelo contribuinte), e, também, foi comprovada a veracidade tanto dos valores declarados nas DIAP’s quanto dos valores escriturado nos livros fiscais;

2 – Com relação ao item Impugnação x Livros Contábeis, restou comprovado que os valores transcritos nas tabelas apresentadas na impugnação, retratam exata e fielmente os valores registrados nos livros contábeis da autuada. Ressaltamos que após a realização da escrituração contábil, foram reescriturados os livros fiscais com os devidos ajustes conforme planilha conta corrente do ICMS 2011 e 2012 anexo.

De Acordo: Marco Antônio Braga Queiroz –Mat.27.186-1 e Eduardo Correa Tavares Coordenador de fiscalização – COFIS.       

Sobre o resultado da diligência, o processo veio a julgamento em 25.10.2017. Desta forma, adoto parte do relatório, fls. 510/512, elaborado pelo Membro-Relator da JUPAF, Gilson Carlos Rodrigues, para melhor compreensão e consolidação da matéria pelos meus pares, na qual passo transcrever a conclusão e voto:

no Demonstrativo do Conta Corrente do ICMS – Exercício de 2010, folha 20, os agentes fiscais apuraram diferença a recolher nos meses de janeiro a março, sendo que os outros meses do exercício apresentou DIF. APURADA negativa, ou seja, na ação fiscal os débitos menos os créditos e ICMS recolhido foram superiores aos valores encontrados na ação fiscal, terminando o exercício de 2010 com SALDO CREDOR de R$ 97.981,56, utilizado como SALDO DO PERÍODO ANTERIOR na conta corrente do exercício de 2011, folha 19;

– os valores apurados pelo fisco no exercício de 2010, folha 20, não divergiram dos valores contábeis, sendo mantidas as diferenças de R$ 56.118,47 de janeiro/2010, R$ 91.786,02 de fevereiro/2010 e R$ 18.080,78 de março/2010;

– observamos que no Demonstrativo do Conta Corrente do ICMS – exercício de 2011, folha 19, uma discrepância muito grande entre os débitos e créditos na coluna “na ação fiscal”, que totalizam crédito de R$ 1.257.190,83 e débito de R$ 2.820.431,76, não refletindo os valores corretos escriturados no Livro Razão, folha 397, que totalizam créditos de R$ 1.257.190,83 e débitos de R$ 1.677.282,65, resultado ICMS devido e recolhido no valor de R$ 420.091,82;

– enquanto que no exercício de 2012, a Apuração do ICMS devido com base na ESCRITA CONTÁBIL, folha 398, os valores dos créditos são iguais aos valores constantes do Demonstrativo do Conta Corrente do ICMS – exercício de 2012, folha 18, apresentado pelos agentes fiscais na apuração do contribuinte e “na ação fiscal”, ou seja, não houve diferença nos valores apresentados pelo contribuinte e na fiscalização. R$ 1.166.199,72;

-com relação aos débitos, a Apuração do ICMS devido com base na ESCRITA CONTÁBIL, folha 398, o contribuinte aumentou os valores dos débitos, com relação a sua apuração apresentada na fiscalização, gerando diferença a recolher nos meses de agosto R$ 20.538,51, setembro R$ 47.428,27, outubro R$ 48.429,75, novembro R$ 51.816,51 e dezembro R$ 70.752,90, estes valores fazem parte da composição do crédito tributário, complementando os valores recolhidos anteriormente. Nesta apuração o total dos débitos somam R$ 1.995,794,21, enquanto que no Demonstrativo da  Conta Corrente do ICMS – exercício de 2012, folha 18, na coluna “na ação fiscal”, o total dos débitos é R$ 3.091.708,28, ressaltamos que no mês de dezembro/2012 “na ação fiscal” os créditos totalizaram R$ 190.088,73 e os débitos R$ 731.620,91, gerando ICMS de R$ 541.532,18, enquanto que na escrita contábil, o ICMS a recolher é R$ 134.021,46, foi recolhido R$ 63.268,56, ficando uma diferença a recolher de R$ 70.752,90;

– o Auto de Infração nº 1393/2014 lança valores de ICMS – Antecipação Substituição Tributária, folhas 16 e 17, sobre notas fiscais de entradas de mercadorias que não foram questionadas pela impugnante, portanto, serão mantidas no crédito tributário;

– os agentes fiscais não arbitraram valores, mas utilizaram os valores escriturados no Registro de Saídas que não refletiam os valores no Livro Razão que é o livro contábil que registra todas as movimentações financeiras da empresa, suas receitas pelas vendas e suas despesas pagas com os recursos gerados;

– concluímos que a autoridade fiscal foi induzida ao erro na determinação do crédito tributário formalizado pelo Auto de Infração, em decorrência de ter baseando-se, somente, na escrita dos livros fiscais, não atentou à possibilidade de buscar mais elementos para substanciar os indícios que ora apresentavam-se. Por outro lado, a impugnante foi bastante contundente na peça impugnatória, trazendo aos autos, elementos bastantes e suficientes para comprovar a fragilidade do levantamento realizado pela autoridade fiscal, conforme foi comprovada pela Diligência Fiscal;

– apresentamos, em anexo, Demonstrativos da Composição do Crédito Tributário, totalizando R$ 436.960,07 de ICMS e R$ 212.285,25 de Multa. Atualizamos monetariamente e com juros totaliza R$ 1.380.557,08;

– O VOTO

Diante do exposto, reconheço a impugnação em razão da sua tempestividade, para julgar a AÇÃO FISCAL PARCIALMENTE PROCEDENTE. 

Da decisão da JUPAF a Julgadora Edy Pinheiro de Oliveira abriu voto divergente, seguido pelo Presidente João Bittencourt da Silva, nos seguintes termos, síntese:

– a Lei n° 8.137/90 é clara em seu art. 1°, inciso I, ao ditar que omitir informação é conduta que constitui crime contra a ordem tributária;

– diligência realizada, fls.402/405, foi aberta e ampla e, converteu-se em nova ação fiscal, em razão da entrega extemporânea da documentação contábil;

– ressalto o minucioso trabalho realizado pelo Auditor que realizou a diligência, mas, a tradição de nossa Secretaria é que as ações fiscais sejam realizadas por equipes;

– por tudo que foi exposto, peco vênia para divergir do voto do relator – vencedor – e, votar pela NULIDADE DA AÇÃO FISCAL, o que permite a correção dos erros cometidos e a efetivação de novo lançamento, em razão do crédito tributário encontrar com sua exigibilidade suspensa.  

Por fim, remetidos os autos à Procuradoria Para Assuntos Fiscais, por meio do Parecer PTRI/PGE, (Fls. 526/536), se posicionou nos seguintes termos, passo a ler a conclusão:

– diante do exposto opino pela reforma da Decisão n° 183/2017 – JUPAF, por ter seu fundamento no entendimento de que a escrituração fiscal necessita ser corroborada pela escrita contábil, por si só, como condição para ser tida como verdadeira. Em consequência, opino pela manutenção do Auto de Infração n° 1.393/2014, por conter os requisitos formais de lavratura e ter sido realizado com base nas informações prestadas pelo próprio contribuinte, podendo ser amparado pelo permissivo art. 466, V do Decreto n° 2269/9 – RICMS, conforme as razões expostas neste opinativo.  

É o relatório. 

PARECER E VOTO

Antes de adentrar no mérito da questão, vejo que o litígio fiscal repousa na possibilidade ou não de acolhimento dos livros contábeis da impugnante, como prova de licitude de demonstrar os fatos geradores e valores recolhidos de ICMS. Embora não apresentados a Fiscalização quando solicitados. Se os referidos registros – Livro Razão, são prestáveis a ponto de servir como prova da extensão da obrigação tributária.     
Desta forma, Presidente da JUPAF autorizou diligência a fim de verificar as alegações de inconsistências de valores de ICMS, entre o auto de infração, DIAP’s, livros fiscais e contábeis, em prol da verdade material. O fato motivador do Auto de Infração, Termo de Encerramento, fl.383, foi pelo descumprimento de recolher o ICMS normal e antecipação. No presente caso, não ficou comprovado embaraço a Fiscalização em razão da negativa de exibição dos livros e documentos fiscais.
Os resultados da diligência apontam valores divergentes em relação às informações declaradas na DIAP e Livros de Saídas. Contudo, os Agentes diligenciadores da Secretaria da Fazenda confirmam na Informação Fiscal n° 348/2017, fl. 404, a veracidade das alegações da impugnante ao afirmar que eventuais equívocos de escrituração fiscal, débitos e créditos fiscais, foram sanados nos livros contábeis. Vejamos: …restou comprovado que os valores transcritos nas tabelas apresentadas na impugnação, retratam exata e fielmente os valores registrados nos livros contábeis da autuada. Ressaltamos que após a realização da escrituração contábil, foram reescriturados os livros fiscais com os devidos ajustes conforme planilha conta corrente do ICMS 2011 e 2012, fls: 407/410.  

Desta forma, observo que os assentamentos das operações nos livros contábeis da impugnante, após confirmação de diligência, dado a sua amplitude, comportam perfeitamente todos os valores pertinentes as movimentações de compra e venda do caso analisado (anos 2011/2012); sobrepondo falhas de informações registradas no Livro de Registro de Saídas. Assertiva poder ser verificada no Livro Razão exercício de 2012, conta “ICMS a Recolher”, onde os fatos contábeis estão registrados de modo a identificar cada valor, referente a cada débito e crédito, fls.630/696; do mesmo modo registrado no ano de 2011 a conta “ICMS a Recolher” com as mesmas características.   

Concluo que o desdobramento da decisão da JUPAF não merece qualquer reparação, pois o entendimento da maioria do Julgadores conduziu a sentença final baseado nos livros obrigatórios da impugnante, na qual o livro contábil, após diligência, reune os elementos necessários que passou a fundamentar aplicação ou não de penalidades.

Assim, ambas obrigações acessórias: livros fiscais e contábeis comunicam entre si, pois em caso de eventuais vícios de escrituração é importante e indispensável conferir um ou outro, pois trata-se uma prova documental no processo administrativo. 

Veja-se o que dispõe o CPC:

Art. 417 Os livros empresariais provam contra seu autor, sendo lícito ao empresário, todavia, demonstrar, por todos os meios permitidos em direito, que os lançamentos não correspondem à verdade dos fatos.

(…)

Art. 419 A escrituração contábil é indivisível, e, se dos fatos que resultam dos lançamentos, uns são favoráveis ao interesse de seu autor e outros lhe são contrários, ambos serão considerados em conjunto, como unidade. (Grifo Nosso) 

Como se nota nos autos, a diligência ocorrida nos livros contábeis confirma a força probante dos mesmos na verificação da verdade material, tanto para o fisco como também para o contribuinte. A questão se torna mais clara no Decreto 2269/98. Assim, dispõe:

Art. 455. No interesse da Fazenda Estadual, será procedido exame nas escritas fiscal e contábil das pessoas sujeitas à fiscalização, especialmente no que tange à exatidão dos lançamentos e recolhimento do imposto, consoante as operações de cada exercício ou período sob fiscalização.

(…)

Art.  465. Reputar-se-á infração à obrigação tributária acessória a omissão de documentos de entrada na escrita fiscal desde que registrados na escrita comercial. (grifo nosso) 

Ante estas disposições legais, não há dúvidas sobre a condição essencial e indispensável da escrituração contábil, muito embora a impugnante tenha ocorrido em situação de desencontro de dados na apuração nos livros fiscais e DIAP, ou a falta de entrega dos mesmos a fiscalização em tempo hábil. No entanto, não impede que o pleno Conselho do CERF examine o mérito, dando preferência à “verdade material” em detrimento da mera “verdade formal”.     

Nesse sentido, o resultado da diligência nos mostra que a reescrituração dos livros fiscais, fl.404, período de 2011 e 2012, com base em diligência na escrita contábil, confere que somente parte do crédito tributário exigido no auto de infração é devido. Assim sendo, não há motivos para desqualificar as conclusões dos autores da diligência, na qual constataram, repriso:  … “que os valores transcritos nas tabelas apresentadas na impugnação, retratam exata e fielmente os valores registrados nos livros contábeis da autuada. Ressaltamos que após a realização da escrituração contábil, foram reescriturados os livros fiscais com os devidos ajustes conforme planilha conta corrente do ICMS 2011 e 2012 anexo”. Fls.404.

Desta forma, entendo que o conteúdo dos livros contábeis apensados aos autos sana equívocos de escrituração no livro de saída, cujos dados utilizados para formalização do Auto de Infração, ora combatido, não refletiam corretamente os valores consignados no Livro Razão que serviu de base para apuração dos impostos.

O próprio CPC, art. 414, destaca que os livros empresariais (entradas, saídas, contábeis e outros) com observância das disposições legais fazem prova a favor do empresário. Com isso, entendo que a decisão proferida pela JUPAF, pela maioria da turma, foi perfeitamente acertada; o membro-relator, subsidiado pelas informações obtidas em diligência, tece sua análise técnica de forma minuciosa, fls.509/511, com desdobramento nos lançamentos contábeis e auto de infração; identifica cada débito e crédito; cada base de cálculo; diferenças a recolher em cada período; impostos recolhidos, enfim, o trabalho de auditoria tributária comprova a valoração das provas.

Assim, após exaustiva e detida análise dos autos, estou convicto que as verificações   dos lançamentos nos livros contábeis da impugnante são confiáveis e que parte do crédito tributário lançado no auto de infração primitivo é improcedente; não se coadunam com a realidade; faço esta análise de forma livre e apoiado em provas arroladas nos autos.

Por essa razão, convenço-me que o Demonstrativo da Composição do Crédito tributário, fls. 514, totalizado o crédito tributário R$ 940.875,56, ainda a computar novas atualizações, constitui o real valor a ser devido pela impugnante consoante os argumentos acima expedidos.

Quanto aos votos divergentes é importante trazê-los à baila, onde os Nobres Julgadores da JUPAF anunciam que as informações da impugnante denotam sinais agravantes, por não atender formalidades fiscais. Portanto, em tese, haveria prática de crime contra a ordem tributária (Lei 8.137/90, art. 1º, I) a serem imputados aos representantes legais da empresa. Resumindo: consta dos autos que os investigados teriam omitido informações.        

Vamos a análise. Primeiramente os crimes de ordem tributária. Cabe mencionar que não consta nos autos do processo nenhum tipo de narrativa, por parte dos autuantes, que a impugnante teria praticado atos que configuram crime contra a ordem tributária, ensejando, assim, abertura de inquérito policial.

De outro modo é importante frisar que tais crimes jamais podem ser julgados ou denunciados ao Conselho Estadual de Recurso Fiscais-CERF por se tratar de matéria penal. Conclui-se então que a representação fiscal para fins penais não é de competência do CERF.

O tribunal do CARF tem entendimento sumulado, in verbis:

Súmula CARF nº 28, vinculante.

O CARF não é competente para se pronunciar sobre controvérsias referentes a Processo Administrativo de Representação Fiscal para Fins Penais.

Os crimes de sonegação fiscal são cometidos geralmente por pessoas físicas ligados a pessoa jurídica: diretores, administradores, gerentes ou funcionários responsáveis, desde que tenham participado do ato de sonegar, omitir informações, enfim, condutas irregulares tipificados na norma.

Não é simplesmente qualquer alegação de ato supostamente ilícito que pressupõe uma ação mais severa por parte do Estado aos contribuintes amapaenses. O voto divergente de Primeira instância não observou que a instauração de inquérito da persecução penal não pode prosseguir sem antes da constituição definitiva do crédito tributário, condição indispensável para propositura de ação penal.

Até porque a posição do judiciário e majoritária no sentido que os crimes previstos no art.1°, Lei n° 8.137/90 são de resultado material, ou seja, em que há necessidade de comprovação de que o autor agiu de forma dolosa com intuito de consumar a redução do fato jurídico, por meio de critérios nada republicanos. O que não ficou comprovado neste processo.

Nessa esteira de pensamento, a consumação do ilícito tributário, consequentemente aplicação de sanções penais, será possível depois de esgotado os Recursos nas instâncias administrativas. Entendimento pacificado no STF: 

Súmula Vinculante 24:

Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º,incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo. 

Lei nº 9.430/1996 também dispõe:

Art. 83.  A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a Previdência Social, (…) será encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente. 

Enquanto isso, até o crédito tributário não se constituir, definitivamente, em sede administrativa, notadamente no Conselho Estadual de Recursos Fiscais – CERF não se terá por caracterizado a tipicidade penal, tal como previsto no art. 1º da Lei nº 8.137/90. Contudo, a título de prestar esclarecimentos aos meus pares, o contribuinte/autuado que promover o pagamento do tributo, antes do recebimento da denúncia pelo Judiciário, extingue-se a punibilidade. Resumindo, tanto o pagamento integral como o parcelamento do tributo provocarão a extinção de punições.  

Segunda análise da divergência, decorre de entendimento que teria ocorrido nova ação fiscal em virtude da diligência realizada, fls.402/405, em razão da entrega extemporânea de documentos contábil. Para tal conclusão não vejo razões óbvias de insegurança nos trabalhos dos diligenciadores da própria Secretaria da Fazenda.

Os resultados da diligência são conclusivos e mostraram-se úteis porque puderam evidenciar a verdade material em relação aos pontos de discordância, caso contrário nada adiantaria a impugnante apresentar os livros contábeis se os mesmos não pudessem provar em sentido contrário.

Cumpre destacar que durante a diligência o que existiu foi uma ação nos autos em busca da verdade material; a conferir as provas documentais (livros contábeis e fiscais) trazidos pela impugnante.

Com relação apresentação de provas a Lei n° 0400/97 dispõe:

Art. 187. A impugnação, formalizada por escrito e instruída com os documentos em que se fundamentar, será apresentada ao órgão preparador no prazo de trinta dias, (…).

(…)

Art. 188. A impugnação mencionará  

IV – as diligências que o impugnante pretende sejam efetuadas, expostos os motivos que as justifiquem. 

Finalizo o parecer concluindo que a apreciação das provas documentais, Livros Contábeis, Fiscais, DIAP’s e outros elementos, arrolados nos autos, em sede de impugnação, são suficientes para demonstrar o quanto de ICMS não foi recolhido. Pois no rito de diligência, fls.402/405, é possível esclarecer dúvidas suscitadas dos autos pela impugnante, assim, o que predomina no processo administrativo tributário e a busca da verdade material, não estando os Julgadores do CERF encarcerados ao excesso de formalismo, desde que as provas carreadas ao processo façam jus a JUSTIÇA FISCAL!

Diante do exposto, e ainda, de tudo mais que consta do processo, VOTO por conhecer e negar provimento ao Recurso de Ofício, para no mérito confirmar a Decisão de n° 183/2017 do colegiado de primeira instância (JUPAF), com os fundamentos aqui expostos no relatório.     

É o voto que expresso a essa Egrégia Corte.

Sala de seções do Conselho Estadual de Recursos Fiscais em 19/02/2019.