RECURSO VOLUNTÁRIO/OFÍCIO
Nº 020/2019
PROCESSO
28730.0085802008-4
LANÇAMENTO (ESPÉCIE)
AUTO DE INFRAÇÃO N° 141/2007
CRÉDITO TRIBUTÁRIO
R$ 328.319,01
RELATOR (A)
UBIRACY DE AZEVEDO PICANÇO JUNIOR
VOTO DE VISTAS
ANTONIO JOSE DANTAS TORRES
DATA DO JULGAMENTO
30/04/2019
VOTO DE VISTAS
 Valendo-me da prerrogativa prevista no art. 51 do Regimento Interno deste E. Conselho, pedi vistas do presente processo para o fim de analisar melhor os fatos e circunstâncias que compõem o feito, apresentando, neste momento, meu voto por escrito, nos termos a seguir expostos.
De acordo com relatório e voto, do ilustre Relator Conselheiro Ubiracy Picanço, “trata-se de Recurso de Voluntário interposto pelo contribuinte, nos termos do art. 205 da Lei n° 0400/1997, contra Decisão nº 158/2013 – JUPAF (fls. 600/603), que julgou parcialmente procedente o lançamento.”
O referido lançamento foi formalizado em 13/02/2008, com a ciência do contribuinte por A.R. (fl. 405 v.), e impugnado pelo contribuinte em 14/03/2008 (fls. 413/433). No entanto, a Decisão nº 158/2013 somente foi proferida em 11/12/2013 (fls. 600/603). Consta nos autos que o processo somente foi movimentado em 06/12/2018 (606), pelo presidente da JUPAF, informando da necessidade de dar ciência ao contribuinte da Decisão nº 158/2013. O contribuinte foi cientificado por A.R. em 07/01/2019 (fl. 607), da decisão proferida pela JUPAF em 2013. E, em 06/02/2019 (fls. 609/626) apresentou recurso voluntário contestando a Decisão nº 158/2013-JUPAF.
Portanto, os autos vieram a este CERF/AP, após decorridos mais de 5 (cinco) anos, contados da data da decisão “a quo”, e foi distribuído para o Conselheiro Relator Ubiracy  Picanço, cujo voto foi apresentado em 30/04/2019.
Embora o ilustre relator não tenha mencionado estes fatos, o Conselheiro Marcelo Gama levantou a hipótese do crédito tributário ter sido atingido pela prescrição intercorrente administrativa, em razão do tempo decorrido entre a decisão de primeira instância e a ciência do contribuinte e o julgamento neste CERF/AP, que soma mais de 5 anos.
A questão não foi arguida pelo contribuinte em seu recurso, mas entendo que o fenômeno jurídico da prescrição intercorrente administrativa, merece atenção e análise deste E. Conselho. Primeiro por ser matéria de ordem pública, que pode ser apreciada a qualquer tempo e juízo, inclusive de ofício. Segundo porque, assunto de tamanha relevância, não pode passar sem manifestação deste E. Colegiado. Por isso, resolvi enfrentar a questão e apresentar meu voto por escrito, estritamente sobre essa matéria.
O tema é polêmico e vem sendo aflorado constantemente pelos doutrinadores tributaristas. Neste voto, me reservarei a comentar a posição majoritária e até agora prevalecente no judiciário brasileiro. 
A decadência e prescrição são mecanismos do sistema jurídico para absorção de incertezas (em atenção ao princípio da segurança jurídica) havidas nos feitos administrativos ou judicias. São limites impostos pelo próprio ordenamento à positivação do direito, seja mediante o exercício do próprio direito, decadência, ou o exercício da ação, prescrição. Em resumo, podemos dizer que a decadência, no Direito Tributário, diz respeito ao lapso temporal que vai da ocorrência do fato gerador até a formalização do crédito tributário; enquanto que a prescrição, refere-se ao lapso temporal entre a data da constituição definitiva do crédito tributário até sua cobrança judicial. Especificamente quanto a prescrição, o CTN, em seu art. 174, dispõe: 
Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.
O ponto crucial da questão é saber quando o crédito tributário se torna definitivamente constituído, para se determinar o termo inicial para contagem do prazo prescricional.      
Uma vez formalizado o lançamento mediante auto de infração (ou notificação de lançamento), e o contribuinte não paga e nem oferta defesa em tempo hábil, transcorrido esse prazo, o crédito tributário estará definitivamente constituído administrativamente. Contudo, havendo impugnação do lançamento (ou recurso) só se pode considerar definitivamente constituído o crédito tributário, quando o procedimento se exaurir de modo definitivo perante a instância administrativa, ou seja, quando não couber mais nenhuma reclamação ou recurso no âmbito administrativo, após a decisão de primeira ou segunda instância.
Portanto, enquanto pendente de julgamento na esfera administrativa, não se pode falar de crédito tributário definitivamente constituído, porque a reclamação ou recurso, suspendem a exigibilidade do crédito tributário, conforme dispõe o inciso III, do art. 151, do CTN:
Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:
[…]
III – as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo;
[…]
Mas, e se a decisão administrativa final demorar mais de 5 (cinco) anos para ser proferida, pode-se dizer que ocorreu a prescrição intercorrente? Esse instituto pode ser aplicado na esfera administrativa?
De acordo com Harada[1], “a prescrição intercorrente no Direito Tributário é resultante de construção doutrinária e jurisprudencial para punir a negligência do titular de direito e também para prestigiar o princípio da segurança jurídica, que não se coaduna com a eternização de pendências administrativas ou judiciais. Assim, quando determinado processo administrativo ou judicial fica paralisado por um tempo longo, por desídia da Fazenda Pública, embora interrompido ou suspenso o prazo prescricional, este começa a fluir novamente. Em outras palavras, a prescrição intercorrente puniria a demora na tramitação dos processos administrativos fiscais, que ficassem pendentes de decisão administrativa por um prazo maior que 5 (cinco) anos.”
Embora pareça razoável a tese de que a administração pública não pode “eternizar” o crédito tributário, nem se valer de sua própria desídia para “levar vantagem”, a prescrição intercorrente no âmbito do processo administrativo fiscal, ainda não vem obtendo êxito nas esferas judiciais, conforme jurisprudência dos tribunais superiores:
“TRIBUTÁRIO E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MULTA DO ART. 23, § 2º DA LEI 4.131/62. ARGÜIÇÃO DE PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA INTERCORRENTE. NÃO OCORRÊNCIA. TERMO INICIAL. CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ARTIGO 174, DO CTN. […] 7. O recurso administrativo suspende a exigibilidade do crédito tributário, enquanto perdurar o contencioso administrativo, nos termos do art. 151, III do CTN, desde o lançamento (efetuado concomitantemente com auto de infração), momento em que não se cogita do prazo decadencial, até seu julgamento ou a revisão ex officio, sendo certo que somente a partir da notificação do resultado do recurso ou da sua revisão, tem início a contagem do prazo prescricional, afastando-se a incidência prescrição intercorrente em sede de processo administrativo fiscal, pela ausência de previsão normativa específica. […].” (STJ, Resp 840.111/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, 02.06.2009).
STJ – AREsp: 79301
[…] Em relação ao tema da prescrição intercorrente, em sede de procedimento administrativo, pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que a impugnação ou o recurso administrativo têm por efeito suspender a fluência do prazo prescricional, não sendo de se cogitar de prescrição intercorrente na via administrativa, ante a ausência de previsão normativa específica. […] (STJ – AREsp: 79301 RS 2011/0190403-0, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Publicação: DJ 29/04/2015) (Grifou-se)
Oportuno citar ainda a Súmula nº 11 do CARF, que dispõe: “Não se aplica a prescrição intercorrente no processo administrativo fiscal.”
Ademais, considero relevante registrar que a jurisprudência contrária a possibilidade de configuração da prescrição intercorrente no processo administrativo tributário, também sustenta a inexistência de legislação complementar que disponha acerca de sua possibilidade, uma vez que prescrição e decadência são institutos que somente podem ser definidos por lei complementar.
Leandro Paulsen faz esse registro em sua obra doutrinária, nos seguintes termos:
“A jurisprudência predominante é no sentido de que não há prazo para a conclusão do processo administrativo fiscal ao argumento de que a lei complementar de normas gerais em matéria tributária não estabelece prazo específico para tanto (prazo de perempção), além do que, lançado o crédito, não mais se fala em decadência e, de outro lado, o prazo prescricional só tem início com a constituição definitiva do crédito, o que ocorre ao final do processo administrativo fiscal.”[2]
Convém ainda registrar a seguinte decisão do STF, no mesmo sentido:
“EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. NORMA DO ESTADO DE SANTA CATARINA QUE ESTABELECE HIPÓTESE DE EXTINÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO POR TRANSCURSO DE PRAZO PARA APRECIAÇÃO DE RECURSO ADMINISTRATIVO FISCAL. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO, ART. 16. ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL, ART. 4º. ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 146, III, B, DA CONSTITUIÇÃO. A determinação do arquivamento de processo administrativo tributário por decurso de prazo, sem a possibilidade de revisão do lançamento equivale à extinção do crédito tributário cuja validade está em discussão no campo administrativo. Em matéria tributária, a extinção do crédito tributário ou do direito de constituir o crédito tributário por decurso de prazo, combinado a qualquer outro critério, corresponde à decadência. Nos termos do Código Tributário Nacional (Lei 5.172/1996), a decadência do direito do Fisco ao crédito tributário, contudo, está vinculada ao lançamento extemporâneo (constituição), e não, propriamente, ao decurso de prazo e à inércia da autoridade fiscal na revisão do lançamento originário. Extingue-se um crédito que resultou de lançamento indevido, por ter sido realizado fora do prazo, e que goza de presunção de validade até a aplicação dessa regra específica de decadência. O lançamento tributário não pode durar indefinidamente, sob risco de violação da segurança jurídica, mas a Constituição de 1988 reserva à lei complementar federal aptidão para dispor sobre decadência em matéria tributária. Viola o art. 146, III, b, da Constituição federal norma que estabelece hipótese de decadência do crédito tributário não prevista em lei complementar federal. Ação direta de inconstitucionalidade conhecida e julgada procedente.” (STF, ADI 124/SC, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 01.08.2008).
Contudo, não se pode deixar de mencionar que, recentemente, o STJ proferiu uma decisão reconhecendo a prescrição intercorrente administrativa, com base na Lei nº 9.873/99. Porém, a decisão se refere a processos administrativos não tributários. O Superior Tribunal de Justiça admitiu a prescrição tomando por base o prazo de 03 (três) anos nos termos da Lei 9.873, de 1999, a qual reza que: “Art. 1º (…) Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralização, se for o caso.”
Portanto, a decisão do STJ não trata exatamente de processos administrativos tributários e por isso, não posso considerar como paradigma para sustentar a prescrição intercorrente administrativa neste caso, servindo, porém, de alerta para o debate do tema, que vem ganhando espaço entre os doutrinadores.
Com efeito, no caso presente, independentemente das razões ou motivos “interna corporis” que resultaram na paralização do processo na JUPAF, por mais de 5 (cinco) anos, não há que se falar em prescrição intercorrente administrativa do crédito tributário, conforme jurisprudência do STJ e por ausência de lei complementar que a ampare.
VOTO
Diante do exposto, considerando que a prescrição é matéria ordem pública, que pode ser apreciada a qualquer tempo e juízo, conheço, de ofício, a matéria como preliminar, para, ao mesmo tempo, negar-lhe provimento e afastar a incidência da prescrição intercorrente administrativa nos autos em análise. No mérito, acompanho o voto do Relator Ubiracy Picanço que manteve a Decisão nº 158/2013-JUPAF/AP, em todos seus termos.
É o voto que expresso a Egrégia Corte do Conselho de Recursos Fiscais.
Sala de seções do Conselho Estadual de Recursos Fiscais em 08/05/2019.