RECURSO DE OFÍCIO
054/2018
PROCESSO
28730.004740/2015-0
LANÇAMENTO (ESPÉCIE)
AUTO DE INFRAÇÃO  N° 1617/2014
CRÉDITO TRIBUTÁRIO
R$ 393.635,33
RELATOR (A)
SERGIO FLAVIO GALDINO LIMA
DECISÃO
CERF-PLENO
DATA DO JULGAMENTO
23/10/2018
RELATÓRIO
Trata-se de Recurso de Ofício ao Conselho Estadual de Recursos Fiscais – CERF, nos termos do art. 206 da Lei n° 0400/97, tendo em vista a decisão do órgão colegiado da JUPAF ter considerado improcedente Auto de Infração (fls.04/39), assim segue recurso oposto à Decisão nº 050/2017.
O auto de Infração impõe a exigência de crédito tributário no montante de R$ 393.635,33 (Trezentos e noventa e três mil, seiscentos e trinta e cinco reais e trinta três centavos). A infração notícia que o contribuinte utilizou crédito fiscal de ICMS, em desacordo com a legislação tributária vigente e não apresentou o livro de registro de entradas referente ao exercício de 2010; e as notas fiscais de entradas relativo aos exercícios de 2010 e 2011, ocasionando o “estorno dos créditos” fiscais declarados pelo contribuinte, conforme o Demonstrativo de Retificação da Conta Corrente Fiscal – 2010 (as fls. 22) e o RESUMO DA DIAP de 2011 (as fls. 21).  
Assim, pelo fato descrito, teria o contribuinte cometido infração no art. 34, inciso II, III, VI, IX, XIII, XVIII, XVII e XVIII; 77,80 e §§ 1° e 2° do art. 81; art. 195, II e art. 196, anexo I , do Decreto n° 2269/98 – RICMS-AP. Sendo proposta a aplicação de multa por infração com fulcro no art.161, inciso XXXVII, alínea “a” e inciso XXXIX, alínea “b da Lei n° 0400/97-CTE-AP.
Na sequência contribuinte insurge contra o auto de infração impugnando os termos da exigência, (fl.53 a 57). Síntese dos argumentos:
– a fiscalização estornou totalmente os créditos fiscais declarados pelo contribuinte nas DIAP’s do exercício 2010 e 2011; como se não existissem as notas fiscais de entradas;
– a fiscalização deixou o contribuinte sem nenhum crédito fiscal no período, cobrando integralmente o valor dos débitos apurados, sem direito a crédito (ofensa ao princípio da não cumulatividade);
– a impugnante pergunta: Qual o dispositivo legal que manda anular todos os créditos do contribuinte?
– quanto ao ano de 2011, o estabelecimento impugnante é filial da Matriz localizada em Macapá, e recebeu suas mercadorias como transferência da Matriz. Na verdade, houve simples transferência de mercadorias entre a Matriz (Macapá) e sua Filial em Santana, não houve compras, mas transferência interna de mercadorias de um estabelecimento para outro do mesmo titular;
– a multa aplicada não procede, pois a questão tratada pela fiscalização foi de “estorno de crédito” e não de sonegação.
Seguindo o curso regular processual, os autos vieram conclusos ao Relator da JUPAF, que após a análise considerou pertinentes alegações da impugnante, cujo libelo basilar foi decidido improcedente a ação fiscal. Destaco, resumidamente, o relatório:
“Exercício de 2010: Os auditores fiscais apresentaram um demonstrativo, folha 22, RETIFICAÇÃO DA CONTA CORRENTE DO ICMS – EXERCÍCIO DE 2010, não informando valores das entradas e crédito nas colunas “NA AÇÃO FISCAL”, mantendo somente os valores de saídas e débitos. Desta forma, o Demonstrativo apura uma diferença a recolher exatamente os valores totais mensais dos débitos pelas saídas, sem conceder crédito fiscal pelas entradas de mercadorias para comercialização.
 O ICMS é não cumulativo. Não podemos só manter os valores dos débitos e não conceder crédito fiscal pelas entradas de mercadorias. Fundamentação: Lei n°0400/97-CTE-AP, art. 50, II, o imposto será não cumulativo.
“Exercício de 2011: Os auditores fiscais apresentaram um demonstrativo, folha 23 a 36, DEMONSTRATIVO DE ESTORNO DE CRÉDITO FISCAL – 2011, destacando notas fiscais de entradas, mês a mês. Várias notas fiscais de transferência são relacionadas, mas somente algumas notas fiscais de transferência foram estornadas os créditos fiscais. Todas com alíquota de 17% (dezessete por cento) de ICMS.
A impugnante apresenta vias de notas fiscais de transferência, folhas 65 a 76, demonstrando o destaque do ICMS. Documentos Fiscais emitidos para o deslocamento das mercadorias, caracterizando a transferência física e fiscal, gerando débito para o emitente e crédito fiscal para o destinatário (filial).
Somos favoráveis à manutenção dos créditos, porque as operações de transferência de mercadorias geram débito fiscal para o estabelecimento emitente e crédito fiscal para o estabelecimento recebedor das mercadorias transferidas.
Com essas observações, o ilustre Relator apresentou seu voto (fls. 94), no que foi acompanhado pela maioria dos julgadores em sua decisão. Que conheceu a impugnação em sua TEMPESTIVIDADE, para julgar a AÇÃO FISCAL IMPROCEDENTE.
Por fim, remetidos os autos à Procuradoria Para Assuntos Fiscais, por meio  do Parecer CERF n° 09/2018-PETRI/PGE-AP (fls…..), se posicionou nos seguintes termos, resumidamente: opinamos no sentido de que seja reconhecida a ação fiscal como procedente.
Este é o relatório.
PARECER
Antes de adentra no mérito da questão, a corte Plena do CERF, em julgamento proferida nos autos do processo n° 28730.0047862015-2, 25.09.2018, por unanimidade, manteve improcedente ação fiscal relativo ao contribuinte epigrafado, IMPORTADORA E EXPORTADORA 246 LTDA, matriz. Oportuno destacar que naquela ocasião da fiscalização, auditoria foi extensiva as demais lojas pertencentes ao grupo empresarial da impugnante (fls.12), filias.
Nesse sentido, os fatos contidos no processo alhures (n° 28730.0047862015-2) são os mesmos que passo debruçar nos autos, no que tange a filial de Santana. Tendo o mesmo repertório de penalidade e infringência; inclusive as descrições das supostas irregularidades cometidas são textualmente idênticas da matriz.
Assim, tendo em vista que se trata de tema, exaustivamente debatido por este Conselho, na reunião 25.09.2018, envolvendo o mesmo contribuinte; passo a decidir a matéria conforme entendimento lapidado pelos meus pares, que manteve a decisão JUPAF que julgou improcedente a Ação Fiscal.
Retorno ao parecer. Conforme exposto no relatório: a JUPAF decidiu pela ação fiscal improcedente, esvaindo o crédito tributário. Consta também, às fls. 102/106, manifestação expressa da PGE/PTRI recomendando que seja reconhecida ação fiscal como procedente.
De acordo com a descrição do Auto de Infração, o lançamento teve como principal infração o fato do contribuinte “não apresentar o Livro de Registro de Entrada de 2010 e as Notas Fiscais de entradas referentes ao exercício de 2011”, em vista disso, a fiscalização simplesmente estornou todos os créditos do contribuinte, considerando devido todos os débitos declarados.
Quanto a questão de “estorno do crédito”, fica claro que houve vícios insanáveis por parte do ante público fiscalizante, não se trata de erro formal, pois ao proceder os estornos de créditos age em desacordo com a legislação vigente. Para maior clareza, a Lei n° 0400/97 prevê a possibilidade de estorno, desde que as circunstâncias das operações operam para sua aplicabilidade, o que não vem ao acaso analisado. O crédito é reduzido nas seguintes situações, in verbis:
Lei n° 0400/97:
Art. 58 – Salvo determinação em contrário, acarretará a anulação do crédito, devendo o sujeito passivo promover seu estorno:
I – a operação ou prestação subsequente, quando beneficiada por isenção ou não incidência ou prestação de serviço não tributada ou isenta (…);
II – a operação ou prestação subsequente com redução de base de cálculo, hipótese em que o estorno será proporcional à redução;
III – a inexistência, por qualquer motivo, de operação posterior;
V – a integração ou consumo da mercadoria em processo de industrialização, quando a saída do produto resultante não for tributada ou estiver isenta do imposto;
VI – a utilização da mercadoria em fim alheio a atividade do estabelecimento
Assim, compulsando os demonstrativos fiscais e demais elementos que instruem peça básica, fl.41, temos a Ficha de inscrição e a atualização cadastra – FIAC, o qual indica a impugnante exercer a comercialização de brinquedos, artigos recreativos, uso domésticos, eletrodomésticos, peças e acessórias e outros itens. Enfim, isso esclarece que autuada não opera com produtos cujo estorno é obrigatório, aí sim estaria desrespeitando uma regra tipificada no CTE-AP acima mencionado. Como ocorria na cesta básica à época; estorno proporcional de 41,67%.
Pelo contrário, conforme ficou demonstrado nos autos do processo n° 28730.0047862015-2, 25.09.2018, IMPORTADORA E EXPORTADORA 246 LTDA; sede matriz, registrou centenas de operações nos livros próprios de saídas em transferências de mercadorias às filias, cujo registro nas filias ocorre como entradas de transferência oriundas da matriz.
Portanto, na etapa de verificação dos fatos a fiscalização deveria ter confrontado as remessas de mercadorias entre a matriz e filiais e verificado os devidos registros fiscais: débito na matriz, transferência, e crédito nas filias, entradas em transferência.
Igualmente, também não merece qualquer censura a conclusão a que chegou o Relator da Jupaf:  que a própria fiscalização relacionou as notas fiscais de entradas (fls. 23/36).  Portanto, em relação ao período de 2010 e 2011, não vejo motivos para se estornar os créditos do contribuinte.
Apesar da juntada dos levantamentos fiscais ao lançamento do crédito tributário, estes não trazem ao meu convencimento, a demonstração que comprovaria a acusação, visto que, segundo autoridade fazendária, o auto cobra o ICMS aproveitado indevidamente no período de 01/01/2010 a 31/12/2011; aplicado, portanto, a multa prevista no art.161, inciso XXXIX, alínea “b” da Lei 0400/98.
Continuando análise, a multa aplicada versa sobre infração diversa das previstas no Código Tributário, que importe descumprimento de obrigação tributária principal. Então, se concluiu que a ação fiscal exigiu crédito icms estornado não tem fundamentação legal, totalmente contrário ao princípio da não cumulatividade assegurada, art. 19 da Lei Complementar 87/96, conhecida Lei Kandir.
Mais uma vez a legislação estadual não deixa dúvidas, aplicação de penalidades para estorno de créditos, ocorre quando o sujeito passivo promove operações com redução na base de cálculo e outras situações previstas na lei. O que foge ao caso da impugnante. Vê-se que este auto aponta a existência de crédito lançado, corretamente pelo contribuinte (vê resumo DIAP- fls.21), lastreadas com copias de notas fiscais de transferência da matriz (fls.65/76).
Assim, entendo que a multa aplicada pelo fisco, a priori não tem relação com os fatos apresentados no auto de infração, o que mostra total desajusto entre os fatos narrados e aplicação de penalidade, pois tal estorno, pretendido pelo fisco, não mantém sintonia com inciso XXXIX, art. 161 da Lei n° 0400/97.
Assim, com todo respeito aos que pensam diferente, mas, ao meu sentir, o princípio da não-cumulatividade se impõe ao caso, considerando que o Fisco, sem embasamento legal, simplesmente desconsiderou todos os créditos do contribuinte, criando uma ficção de apuração do imposto sem direito a crédito.
Deste feita, vejamos o que diz o CTE/AP:
Lei nº 0400/97
Art. 50 – O imposto será não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa a circulação de mercadoria ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou Distrito Federal.
Art. 55 – Constitui crédito fiscal para fins de cálculo do imposto a recolher:
I – o valor do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento;
No julgado a seguir, E. Conselho do CERF já se posicionou no sentido de garantir o direito ao crédito, mesmo na ausência de livro fiscal, conforme o seguinte acórdão:
ACÓRDÃO Nº 020 /2015
RECURSO VOLUNTÁRIO: Nº 54/2014
PROCESSO: 28730.025292/2011
AUTO DE INFRAÇÃO: Nº 629/2011
VALOR DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO: R$ 300.186,28
 EMENTA: ICMS – AUTO DE INFRAÇÃO.  1) OMISSÃO DE RECEITA. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUSÊNCIA DE ESCRITURAÇÃO DE LIVRO FISCAL. 2) DIREITO AO CRÉDITO FISCAL COMPROVADO.  3) REFORMADA A DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU.
1) Omissão de receita comprovada através da ocorrência de entrada de mercadorias não contabilizadas, em desconformidade com o disposto no art. 34, inciso VI c/c art. 464 do Decreto nº 2.269/98-RICMS/AP.
2)  A aplicação do princípio constitucional da não-cumulatividade impõe o reconhecimento do direito ao crédito fiscal relativo às entradas de mercadorias, conforme art. 55, I, da Lei nº 0400/97 CTE – AP, c/c art. 55 do Decreto n° 2.269/98 RICMS-AP.
3) Decisão nº 144/2013 de 1ª instância, reformada. Lançamento parcialmente procedente.
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, o Conselho Estadual de Recursos Fiscais – CERF/AP, por unanimidade dos seus membros. Decide conhecer o Recurso Voluntário, por tempestivo, para no mérito dar-lhe parcial provimento. E, reconhecer de oficio o direito ao crédito fiscal, na forma do Art.55 do Decreto 2.269/98 c/c Art.55, I, Lei n° 0400/97 CTE – AP, decido por reformar a Decisão de nº144/2013, julgando a ação fiscal parcialmente procedente, devendo a penalidade ser aplicada com base nos artigos 161, VII da Lei n° 0400/97 CTE – AP, e excluído da base de cálculo, as notas fiscais efetivamente escrituradas.
Assim, mesmo se tratando de transferência de mercadorias entre a matriz e  filiais, a Lei complementar 87/96, no art. 12, inciso I, assegura que há o fato gerador do tributo no momento da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular. 
Na prática, esse tipo de movimentação resulta em transação fiscal em ambas as empresas do grupo empresarial; às entradas das mercadorias no estabelecimento da filial em Santana, ocorreu com o destaque do imposto. E foi isso que aconteceu: a matriz emitiu o documento fiscal devido, destacou o imposto e observou os requisitos quanto à emissão da documentação fiscal. O mesmo entendimento se aplica às compras diretas de fornecedores, sem transitar pela matriz; a regra da não-cumulatividade garanti ao aos contribuintes abater valores destacados em nota fiscal (vê fls.65/76-campo valor do ICMS) na operação anterior e evitar de sobre maneira aumento da carga tributária, onerando substancialmente a cadeia de consumo.
Dessa forma, a fiscalização deixou o contribuinte sem nenhum crédito fiscal. Aliás, a fiscalização glosou não só os créditos como também os valores das entradas (fl. 06) no período de 2010, e isso, no meu entendimento, seria considerar que houve entradas sem notas fiscais, o que não é verdade diante das provas documentais contidas nos autos.
Diante do exposto, e por tudo que nos autos consta, voto pelo conhecimento do recurso de ofício, para, no mérito, negar-lhe provimento, e manter a Decisão nº 050/2017, que julgou a AÇÃO FISCAL IMPROCEDENTE. Com os fundamentos no art. 19 da Lei Complementar 87/96 c/c art. 50 e 55, I, da Lei nº 0400/97 CTE – AP.
É o voto que expresso a essa Egrégia Corte.
Sala de seções do Conselho Estadual de Recursos Fiscais em 23/10/2018.