RECURSO VOLUNTÁRIO (Extraordinário)
012/2019
PROCESSO
28730.0046062012-6 (28730.0037962012)
LANÇAMENTO (ESPÉCIE)
NOTIFICAÇÃO DE LANÇAMENTO  N° 2012000021
CRÉDITO TRIBUTÁRIO
R$ 997,73
RELATOR (A)
ANTONIO JOSE DANTAS TORRES
DATA DO JULGAMENTO
29/04/2019
R E L A T Ó R I O
Trata-se de Recurso Voluntário, de caráter extraordinário, nos termos do art. 205, da Lei n° 400/1997, que neste processo, se vincula à Decisão nº 283/2014-JUPAF (fls. 48/59) proferida por aquele órgão julgador de primeira instância, que julgou ação fiscal parcialmente procedente, nos termos do voto do relator.
O recurso é intempestivo, mas trás notícias de decisão judicial transitada em julgado que envolve o crédito tributário lançado na N.L. nº 2012000021, por isso, foi remetido a este CERF/AP para se pronunciar sobre o assunto. 
O crédito tributário, sob análise, foi constituído através da lavratura da Notificação de Lançamento (NL) de n.º 2012000021 (fl. 02), sendo o valor principal de R$ 739,57, que com os acréscimos legais atinge o valor de R$ 997,73. A exigência abrange o período de setembro e outubro de 2011. A infração foi tipificada no item ( A ) ICMS lançado e não recolhido – art. 44, combinado com o artigo 161, inciso I, alínea “a” da Lei n.º 0400/97, sob o código de receita 1825 (diferencial de alíquota).
O Lançamento foi formalizado pela Coordenadoria de Arrecadação – COARE, pelo Fiscal da Receita Estadual Sr. Inácio Flávio dos S. Barroso e a ciência do contribuinte deu-se por Aviso de Recebimento-AR datado de 16/02/2012 (fls. 03).
O contribuinte apresentou, em 02/03/2012, impugnação no prazo legal, pedindo o cancelamento do lançamento, alegando, basicamente, o seguinte:
  • que a Notificação de Lançamento contraria decisão exarada no Processo nº 0031974-14.2011.8.03.0001, que tramitou na 2ª Vara Cível de Fazenda Pública, cuja sentença, transitada em Julgado, decidiu favoravelmente ao contribuinte, proibindo o Estado do Amapá de lançar/inscrever débito relacionado à diferencial de alíquota do ICMS interestadual adquiridos em outro estado pela impugnante para aplicação em suas atividades;
  • que, por ser mera prestadora de serviços, não é contribuinte do ICMS, por isso não cabe a cobrança do tributo em questão.
O processo foi analisado pela JUPAF/AP, que, apesar do contribuinte ter juntado decisão judicial transitado em julgado alegando que os fatos narrados na NL em questão, estariam abrangidos pela sentença judicial, os julgadores “a quo” através da Decisão de nº 283/2014, decidiram pela procedência parcial do lançamento, para excluir apenas uma nota fiscal, cujo imposto foi retido pelo fornecedor.
O contribuinte foi notificado da Decisão da JUPAF em 03/02/2015 (fl. 60) e manteve-se silente. Em razão do diminuto valor do crédito tributário (menor que 2.000 UPFs), não foi formalizado o recurso de ofício.
Somente em 14/01/2019, o contribuinte apresentou documentos (ofício de fl. 68) reclamando que “não estão sendo obedecidas decisões administrativas tomadas anteriormente para retirada dessa cobrança indevida nos processos de nº 0086232017-8; 0086202017-4; 0086162017-8 e nem de Decisão Judicial (processo nº 000123587.2013.8.03.0001) que determinou a suspensão dos lançamentos referentes às cobranças de diferentes alíquotas de ICMS relativo à aquisição de maquinários, equipamentos, insumos e peças para construção civil.” Anexou cópia da sentença que determinou a suspensão da cobrança de ICMS.
Em vista disso, entendeu o Coordenador da COARE (fl. 97) que o processo deveria vir a este E. Conselho para manifestação sobre a decisão judicial.
Os autos foram remetidos à Procuradoria (PTRI/PGE) que, em vista do valor do crédito tributário não ultrapassar ao limite de 30 mil UPF/AP na data do lançamento, com fulcro no inciso I do artigo 10 do Regimento interno do CERF, devolveu o processo sem manifestação expressa, reservando-se, porém, para se manifestar em sessão de julgamento.
Os autos retornaram a este Conselheiro, para emissão de parecer e voto, que submeto a apreciação deste E. Colegiado.
É o que importa relatar.
PARECER E VOTO
O processo teve a sua tramitação normal. O Contribuinte gozou do mais amplo direito do contraditório.
Preliminarmente observo que o processo em análise não se reveste das características típicas do recurso voluntário. Primeiro, porque não combate especificamente a Decisão nº 283/2014-JUAPF. Segundo, porque o “recurso” somente foi impetrado em 14 de janeiro de 2019, portanto, manifestamente intempestivo. No entanto, considerando que o contribuinte apresentou documentos dando notícia que, em tese, o crédito tributário em questão estaria fulminado por decisão judicial transitado em julgado, entendeu o Coordenador da COARE, que o processo deveria subir ao CERF para apreciação do “recurso” do contribuinte por este E. Colegiado.
Em que pese a reclamação apresentada pelo contribuinte, não se revestir dos requisitos legais próprios do recurso previsto no art. 205 da Lei nº 400/97, entendo que a mesma merece ser apreciada por este Colegiado, uma vez que o CERF tem prerrogativas semelhantes a de um tribunal de última instância administrativa, que pode decidir sobre assunto de recorribilidade ou revisibilidade das decisões administrativas envolvendo crédito tributário. Sem olvidar de que, a Súmula 473 do STF permite a administração “anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos, ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.” Por fim, verifico que, no caso presente, existe matéria de ordem pública, que pode ser apreciada a qualquer tempo e juízo.
Com essas escoras, conheço do recurso e passo a analisar o mérito da questão.
De fato, a decisão judicial transitada em julgado, prevalece sobre a decisão administrativa, ainda que posterior ao término do contencioso administrativo. Isso é inegável. Resta saber, porém, se o crédito tributário em questão está abrangido pela citada sentença judicial (fls. 71/77).
Na hipótese, este CERF está sendo instado a se manifestar sobre a decisão judicial anexada pelo contribuinte relativamente ao crédito tributário formalizado na N.L. nº 2012000021, que abrange fatos geradores de setembro e outubro de 2011.
Compulsando a decisão judicial, entendo como crucial para o deslinde da questão, analisar o seguinte trecho da sentença:
Quando ao pedido de restituição de valores pagos a título de diferencial de alíquota , nos anos de 2009 a 2011, analisando os documento juntados, principalmente as notas fiscais de fls.106/146 e 284/636, verifico que se trata de peças de reposição e apesar da autora ter em seu objeto social a atividade de comércio a varejo de peças e acessórios novos para veículos automotores, a quantidade pequena de peças constante nas notas fiscais comprova sua utilização para reposição de seus equipamentos utilizados na construção civil, tanto que as diferenças de alíquotas cobradas são de valores baixo, a maior no valor de R$ 1.517,20, planilha de fls. 230/231.
Portanto, com relação aos valores pagos a título de diferencial de alíquota, nos anos de 2009 a 2011, a autora demonstrou que adquiriu as mercadorias na qualidade de consumidora final, peças de reposição, e, em sendo as mercadorias materiais e equipamentos comprados em outro Estado utilizados ela autora na construção civil, não incide ICMS e nem pode ser cobrado a diferença de alíquota, conforme entendimento pacificado do STF e STJ.
Isto posto, e om base no livre convencimento motivado que formo, julgo procedente, em parte, o pedido da autora para:
Determinar que o Estado abstenha-se de exigir o recolhimento de diferencial de alíquota de ICMS, nas operações interestaduais de aquisição de insumos para utilização na atividade fim da empresa de construção civil, desde que devidamente comprovado o fim a que se destina;
  1. Condenar o Estado a restituir à autora os valores a título de diferencial de alíquota referente às notas fiscais de fla.104/146 e 284/636, atinentes aos anos de 2009 a 2011.
Em detida análise da sentença, verifico que a ação interposta pelo contribuinte foi de “repetição de indébito tributário c/c com ação de fazer e não fazer”, onde obteve êxito parcial, que condena o Estado a restituir imposto pago indevidamente (DIFAL) em relação a aquisição de produtos no período de 2009 e 2011. No trecho acima, percebe-se com clareza que os produtos contidos em algumas notas fiscais eram “peças de reposição de seus equipamentos utilizados na construção civil”, ou seja, produtos semelhantes aos descritos nas notas fiscais relacionadas na NL nº 2012000021 sob análise. Percebo também que, os fatos abrangidos pela sentença judicial (2009 e 2011) alcança os fatos descritos na NL questionada (2011).
Pois bem. Embora a ação impetrada pelo recorrente não combata diretamente o crédito tributário formalizado na NL nº 2012000021, fica evidente que o judiciário amapaense entendeu que o ICMS-DIFAL não pode ser exigido de “peças de reposição de seus equipamentos utilizados na construção civil”. Tal conclusão, me parece que se estende aos produtos descritos nas respectivas notas fiscais objeto do lançamento, pois também são peças, que pela quantidade pequena comprova sua utilização para recomposição de seus equipamentos, como afirmou a r. sentença.
Com efeito, parece lógico que, mesmo discordando da conclusão do judiciário, neste caso, não vejo como prosperar o crédito tributário em análise, pois, a situação se assemelha e numa eventual revisão judicial desses mesmos fatos, seguramente deverá prevalecer o entendimento já firmado na r. sentença.
Ademais, a NL nº 2012000021 indica como código de receita 1825 (DIFAL), mas fundamenta a cobrança no item ( A ) ICMS lançado e não recolhido – art. 44, combinado com o artigo 161, inciso I, alínea “a” da Lei n.º 0400/97, dispositivos que não se prestam para fundamentar esse tipo de exigência, conforme vasta e firme jurisprudência deste E. Conselho:
ACÓRDÃO N° 039/2017 – RECURSO VOLUNTÁRIO Nº 016/2017
PROCESSO Nº: 28.730.0050652013-7 – NL Nº 2012000789
RECORRENTE: ALUSA ENGENHARIA S/A
RECORRIDA: FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL
RELATOR: JOSÉ EMÍDIO GUERRA DAMASCENO
DATA DO JULGAMENTO: 26/06/2017
EMENTA: ICMS. CONSTRUÇÃO CIVIL. NOTIFICAÇÃO DE LANÇAMENTO. 1) CERCEAMENTO DE DEFESA, INOCORRÊNCIA. 2) ICMS DIFAL EM AQUISIÇÃO INTERESTADUAL DE BENS DESTINADOS A USO, CONSUMO E ATIVO IMOBILIZADO POR EMPRESAS QUE SE IDENTIFICAM COMO CONTRIBUINTES DO ICMS. INCIDÊNCIA. 3) EQUÍVOCO NA FUNDAMENTAÇÃO DO LANÇAMENTO. NULIDADE POR ERRO FORMAL.
1) Se a pessoa jurídica revela conhecer plenamente os elementos essenciais que compõem o lançamento, rebatendo-os um a um de forma meticulosa, mediante defesa, abrangendo não só questões preliminares como também de mérito, descabe nulidade.
2) Empresas que promovem, na condição de contribuinte do ICMS, aquisição interestadual de bens destinados a uso, consumo e ativo imobilizado, anuindo para a utilização de CFOP, ultilizando a alíquota interestadual, devem recolher o ICMS diferencial para encerrar as etapas de tributação do imposto.
3) Impõe-se a nulidade do procedimento administrativo fiscal, por erro formal em sua constituição, face à descrição incorreta do fundamento legal na qual se fundou a exação tributária. Não sendo atingido pelo fenômeno da decadência, em observância ao disposto no Art. 173, II, da Lei nº 5.172/66 – CTN, o direito ao crédito tributário pode perseguir nova constituição.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, o Conselho Estadual de Recursos Fiscais – CERF/AP, por unanimidade de votos de seus membros presentes, não conheceu do recurso voluntário por ser intempestivo e, de ofício, reformar a decisão da JUPAF nº 35/2015, e julgar nula a ação fiscal por vício formal (art. 173, II, CTN), podendo perseguir nova constituição com a capitulação adequada (art. 7º, I, c/c art. 54, III, CTE/AP).
Ora, temos aqui uma situação interessante. A rigor, a sentença não atinge diretamente o crédito tributário, embora sirva de paradigma para seu cancelamento, porque atinge o mesmo período e menciona os mesmos produtos listados no lançamento. Num outro giro, constata-se a nulidade do lançamento, por erro formal, o que ensejaria o seu refazimento pelo Fisco, na forma do art. 173, II do CTN.
É uma situação que requer ponderação e prudência deste Conselho, para decidir pela solução menos onerosa à administração pública. Por isso, entendo que a melhor solução, neste caso, é considerar que o custo-benefício, no caso de recomposição do crédito tributário e posterior cobrança pela Procuradoria do Estado, pode resultar num custo mais elevado do que eventual ganho para o Estado. Oportuno lembrar ainda que, a Lei nº 1178, de 02/01/2008, alterada pela Lei nº 2206, de 10/07/2017, dispensa a Fazenda Pública Estadual de executar crédito tributário inferior a 5.000 UPFs.
VOTO
Diante do exposto, e por tudo que nos autos consta, voto pelo conhecimento do recurso voluntário, para, no mérito, negar-lhe provimento, e de ofício, reformar a Decisão nº 283/2014-JUPAF para declarar nula a Notificação de Lançamento nº 2012000021, por vício formal.
É o voto que expresso a Egrégia Corte do Conselho de Recursos Fiscais.
Sala de seções do Conselho Estadual de Recursos Fiscais em 29/04/2019.